A culpa e o mal-estar

A culpa e o mal-estar

O sentimento de culpa está associado às questões morais, éticas, sociais e culturais. Pode ser positivo e indicador de saúde porque regula e equilibra as relações dentro de um padrão de respeito e liberdade entre os envolvidos. A culpa excessiva, por tudo e com todos, entretanto, pode indicar que algo não vai bem. Em seu excesso causa sofrimento e mal-estar.

O sofrimento, em consequência da constante culpa, pode levar o sujeito a sempre tentar agradar a todos com quem se relaciona (família, amigos, colegas de trabalho, o parceiro ou a parceira afetiva/0) numa expectativa de reparar a culpa e aliviar o próprio mal-estar. Em geral, pessoas assim se sentem frequentemente cansadas pela energia que investem ao sustentarem relações em que se colocam como pilares e reparadoras. Mas neste caso, o sofrimento ganha novos contornos e é também aliviado pela dinâmica compensadora que se busca nas relações.

A culpa funciona, então, como uma prisão que recoloca o sujeito no centro do mal-estar em relação a um Outro. A angústia é tamanha que para aliviar ele volta-se ao Outro sempre tentando agradá-lo. Claro, isso é impossível e ele falha, e assim reforça o ciclo de aprisionamento na qual a culpa é alimentada.

A culpa, nesta dinâmica, pode ser de origem mista do real e da fantasia, ou seja, o sujeito sente-se culpado por algo que reconheça ter falhado ou errado perante um fato ou uma pessoa; ou no caso da culpa associada a fantasia, por vezes inconsciente, de não ser/fazer o que deseja para si e o Outro, e assim sentir que falha e erra perante essa idealização frustrada daquilo que se é e faz. Um culpa que mascara o lamento, a melancolia e beira a depressão.

No primeiro caso, digamos que é mais fácil lidar, por ser tratar de questões pontuais, factuais e da ordem do "real". O objeto pode ser enfrentado e a culpa aliviada no confrontamento e resolução do problema.

Já não é assim tão fácil quando a culpa é mais profunda, interna e fantasiosa. Um processo terapêutico pode ajudar o sujeito a elaborar suas ilusões, rever suas frustrações e reconciliar com seu desejos, medos e dores. Isto pode levar algum tempo e depende da capacidade de cada um se haver com as próprias des-ilusões.

Entender que é parte responsável pela culpa e consequentemente pelo próprio mal-estar ajuda a fazer uma movimentação diferente à medida que não precisa mais valer desse desprazer e sofrimento para adiar a verdadeira busca de contentamento na vida.

No final, seu mal-estar e culpa é mesmo sua. Carregá-la eternamente, ou não, pode ser também sua escolha.

*Elaine Andrade - Psicóloga Clínica